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Ao longo da última semana, o Brasil se chocou diante da catástrofe que as chuvas intensas provocaram no Rio Grande do Sul. Dada a magnitude da destruição, o estado vai levar ainda algum tempo para retornar à normalidade. 

Mas no meio de tantas notícias de mortes e interrupção do fornecimento de água e energia elétrica, teve uma que me chamou a atenção. Diversas pessoas gaúchas que vivem com HIV/Aids usaram as redes sociais para manifestarem seu apelo por ajuda por não conseguirem retirar nas farmácias do SUS os comprimidos do seu tratamento antirretroviral.

Situações como essa ao mesmo tempo que infelizmente são frequentes depois de catástrofes climáticas ou humanitárias, tais como enchentes, tsunamis, terremotos, guerras ou nos deslocamentos de refugiados, são potencialmente graves por poderem causar consequências sérias e definitivas para a saúde dessas pessoas.

Quando se trata de tratamento de um vírus como o HIV, a adesão correta ao tratamento antirretroviral tem dois objetivos. Primeiramente, o de controlar a infecção viral e com isso impedir sua progressão para a Aids. Mas também de evitar o surgimento de cepas de HIV resistentes aos medicamentos do esquema.

Diferentemente do tratamento de outras condições, como o diabetes ou a hipertensão arterial, no caso do HIV um período de má adesão aos comprimidos pode ser determinante para a seleção de vírus resistentes tornando aquele esquema terapêutico para sempre ineficaz em um momento posterior em que a adesão correta seja retomada.

Dessa maneira, quanto melhor e mais contínua for a adesão ao tratamento do HIV/Aids, maior e mais duradouro será o seu efeito no controle dessa infecção.

Em situações extremas como a atual do Rio Grande do Sul em que serviços inteiros especializados no acompanhamento de pessoas que vivem com HIV/Aids estão com seus consultórios e farmácias submersos, existem algumas recomendações do que fazer para diminuir o risco de seleção de resistência aos antirretrovirais, e o que não se deve fazer de jeito nenhum por aumentar o risco de isso acontecer.

Começando pelas recomendações do que você deve fazer:

1. Não desista de tentar conseguir seus remédios. No futuro você não vai se arrepender disso. Garantindo o tratamento antirretroviral, as consultas de rotina podem ser reagendadas sem que haja prejuízo significativo.

2.Descubra se o seu município está fazendo algum esquema emergencial para fornecimento de antirretrovirais. A cidade de Porto Alegre, por exemplo, organizou o deslocamento dos atendimentos para os serviços localizados em regiões seguras.

3.Mesmo que tenha perdido a receita com seu o esquema de medicamentos, as farmácias do SUS conseguem por meio do sistema computadorizado de logística de antirretrovirais resgatar o último esquema retirado na farmácia. Mesmo se você estiver em outro município.

4.Se os seus comprimidos acabaram, não se desespere. Alguns dias sem o tratamento não vão causar nenhum problema maior. Nesse caso, se mobilize para assim que puder ir a uma farmácia e os reinicie seguindo a prescrição médica vigente.

O que você não deve fazer para evitar problemas no futuro:

1.Jamais tome os seus comprimidos em dias alternados ou apenas um dos remédios do esquema com o objetivo de fazer os comprimidos remanescentes durarem por mais tempo. Isso pode aumentar a seleção de vírus resistentes.

2.Se você perdeu um dos frascos de comprimidos que compõe o seu esquema antirretroviral, interrompa todo o esquema, e só o reinicie quando tiver ele completo novamente.

3.Não tome os comprimidos do esquema antirretroviral de outra pessoa se ele for diferente daquele que foi prescrito para você.

4.Não tome comprimidos de PrEP como substituição do seu esquema antirretroviral. A PrEP isoladamente não é uma opção de tratamento para o HIV/Aids.

Espero de verdade que os serviços que prestam o cuidado das pessoas que vivem com HIV/Aids do Rio Grande do Sul rapidamente reestabeleçam suas atividades e que para os próximos eventos extremos decorrentes das mudanças climáticas estejamos melhor preparados.

Para fazer doações e ajudar no socorro das vítimas do Rio Grande do Sul, acesse o site: www.paraquemdoar.com.br.

*Texto originalmente postado na seção VivaBem do UOL.

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