
Consulta pública avalia incorporação ao SUS de novo tratamento para HIV
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O Ministério da Saúde abriu uma consulta pública para discutir se o SUS deve incorporar o comprimido coformulado de bictegravir, entricitabina e tenofovir alafenamida (BIC/FTC/TAF). Trata-se de um medicamento moderno, já usado em vários países, que combina três antirretrovirais em uma única dose diária.
Por que isso importa?
O tratamento do HIV no Brasil é altamente eficaz, gratuito e acessível, e hoje a primeira escolha é a combinação de dolutegravir (DTG) com tenofovir desoproxila (TDF) e lamivudina (3TC). Esse esquema funciona muito bem para a imensa maioria das pessoas. Mas, à medida que a população vivendo com HIV envelhece, surgem novos desafios: o TDF pode trazer efeitos sobre rim e ossos, o AZT e o abacavir (usados como alternativas) têm suas próprias limitações, e alguns esquemas de segunda linha, como o que usa darunavir, encarecem bastante o tratamento.
É nesse cenário que entra o BIC/FTC/TAF: eficaz, seguro, com poucas interações medicamentosas e em comprimido único. Nos ensaios clínicos, mais de 90% das pessoas atingiram carga viral indetectável, resultados comparáveis aos melhores esquemas já disponíveis.
O ponto crítico: custo
Se a decisão fosse apenas clínica, a incorporação provavelmente já teria acontecido. O problema é o preço. A fabricante propôs vender ao SUS cada comprimido por R$ 10,44 — mas esse valor depende de o governo garantir a compra para pelo menos 25.500 pessoas por ano. Se esse volume não for atingido, o preço pode chegar a R$ 114,64 por comprimido, o que multiplica o impacto orçamentário em mais de 10 vezes.
As análises feitas pela Conitec estimaram que, no pior cenário, o SUS gastaria entre R$ 984 milhões e R$ 1,8 bilhão a mais em cinco anos. No melhor cenário (com o preço reduzido), o custo extra cairia para cerca de R$ 123 a 144 milhões. Ou seja: a decisão depende muito da garantia de preço.
E o que pensa o paciente?
Na consulta pública, um dos depoimentos trouxe a experiência de quem convive com o HIV e sofre com os efeitos adversos de alguns esquemas atuais. O relato destacou que o BIC/FTC/TAF poderia ser uma alternativa mais confortável, com menos problemas renais e ósseos.
E agora?
Na reunião de junho, a Conitec recomendou preliminarmente contra a incorporação, justamente pelas incertezas econômicas. Mas o tema está em debate, e a consulta pública é a chance de pacientes, profissionais de saúde e cidadãos opinarem.
Mais do que escolher um comprimido, essa discussão coloca em jogo como o SUS equilibra inovação, sustentabilidade financeira e qualidade de vida. O bictegravir pode ser um avanço importante para grupos específicos, mas o desafio é garantir que a incorporação não comprometa a política de acesso universal que é orgulho do Brasil.
A consulta pública está aberta até 25 de setembro de 2025 e pode ser acessada neste link oficial.
*Texto postado originalmente na seção VivaBem do UOL.